A História de Crisântemo
O Estranho no Espelho e a Fuga da Magreza
A história de Crisântemo não começa com um número na balança, mas com a construção de uma arquitetura invisível. Desde menino, convivendo com um corpo grande em uma família de corpos grandes, ele aprendeu cedo a arte da esquiva.
Crisântemo criou um "mundo à parte", um perímetro de segurança onde ele evitava o constrangimento, as cadeiras apertadas e os olhares julgadores. Ele não apenas vivia a obesidade; ele a gerenciava, criando rotas de fuga para não ter que enfrentar a dor de não caber.
Mas o corpo tem seus próprios ultimatos. Quando a pressão arterial subiu, o medo de interromper uma linhagem familiar de longevidade falou mais alto. A cirurgia bariátrica surgiu no horizonte não como um projeto de vaidade, mas como uma tentativa de ganhar tempo de vida.
O processo pré-operatório de Crisântemo foi marcado por uma ironia cruel e pedagógica: as reuniões de preparação aconteciam em uma sala invadida pelo cheiro de comida do hospital. Ali, entre relatos de sucesso e fracasso, ele entendeu que a cirurgia não operava o desejo. Mesmo com medo, quase desistindo ao ler o termo de consentimento, ele seguiu em frente.
O Estranho no Espelho
O que aconteceu depois, há 16 anos, foi um colapso, não uma vitória imediata. Crisântemo entrou no bloco cirúrgico com mais de 200 quilos. Saiu de lá para um processo de perda tão vertiginoso que sua mente não conseguiu acompanhar a velocidade da carne. Ele chegou aos 67 quilos. Para a medicina, um triunfo numérico. Para Crisântemo, um choque de identidade.
Ao olhar-se no espelho, ele não viu o homem saudável que prometiam. Viu um estranho. Viu um corpo que ele descreve como "torto", "deformado", um rosto que os próprios amigos não reconheciam. A magreza extrema não lhe trouxe felicidade; trouxe a sensação de estar doente, frágil, uma "caveira" vestindo a pele de quem ele costumava ser.
Foi aqui que a história de Crisântemo tomou um rumo singular. O reganho de peso começou não como um erro, mas como uma escolha.
"O reganho começou não como um erro, mas como uma escolha."
Ele decidiu, conscientemente, recuperar um pouco de massa para se sentir humano novamente, para preencher a pele e ocupar o espaço de uma forma que lhe parecesse familiar. No entanto, a linha entre o "reganho terapêutico" e a "auto-sabotagem" é tênue.
A Armadilha do Conforto
O estômago operado, que rejeitava a fibra dura da carne e a densidade das proteínas, aceitava com gratidão o conforto macio das massas, das sopas, das "papinhas".
Como vemos na anatomia de um estômago pós-bariátrica, a passagem para alimentos sólidos é restrita, exigindo mastigação exaustiva e causando saciedade rápida (ou desconforto). Já os alimentos pastosos e carboidratos simples deslizam facilmente por esse "funil", não ativam os freios mecânicos da cirurgia e permitem uma ingestão calórica muito maior. Crisântemo encontrou nessa facilidade física um refúgio emocional, e o peso subiu para além do planejado, estacionando hoje na casa dos 138 quilos.
Agora, o ciclo se fecha, mas com uma diferença fundamental: a consciência. As roupas voltaram a apertar, as poltronas de avião voltaram a incomodar, mas a mente de Crisântemo não está mais no "piloto automático" da infância.
Ele não quer a magreza de 67 quilos que o desfigurou, nem os 212 quilos que o aprisionavam. Ele busca um meio-termo habitável. Seu desejo de futuro é "morrer em produção" — continuar aprendendo, reunindo a família, deixando legado.
A lição de Crisântemo é profunda: a cirurgia muda o corpo, mas a reconciliação com a imagem é um trabalho artesanal da alma. Ele nos ensina que o reganho pode ser, em parte, uma tentativa desesperada de se reconhecer no espelho, e que o caminho de volta à saúde exige paciência, não punição.